Rescaldo
Vicente M. |Imagem principal:

Texto:
Vamos então ao rescaldo do que também valeu a pena em 2014, porém, talvez não tenha sido tão indispensável quanto os tradicionais sete que costumamos indicar. Se bem que, pensando bem, talvez alguns até sejam bem indispensáveis sim:
Nothing / Guilty Of Everything (Relapse): Essa banda é uma contradição por aqui. Há uma série de ouvintes que a adoram, consideram GoE um dos discos do ano. Mas à primeira vista ele está muito mais para um oportunista pastiche de shoegazing do que para um disco reafirmador do gênero. Porém, há alguns momentos onde as melodias são memoráveis, as paredes de guitarras se embaralham com o frágil vocal (como em Beat Around The Bush) de forma que o esquema todo passa de fraco para interessante. Nada muito fantástico, mas de vez em quando vale uma visita.
White Suns / Totem (Flenser): Esse disco é intenso. Imagino esses caras sentados nos fundos de uma casa abandonada, em meio a usuários de crack, sem camisa, sob um calor de uns quarenta graus, mastigando bulbos de lâmpadas. É um panorama desses que Totem sugere. Me lembram também a esquizofrenia do Lightning Bolt, porém, um pouco mais controlada, consequentemente, mais eloquente.
Sunn O))) / LA Reh 12 (Southern Lord): Num ano praticamente dedicado ao papel de coadjuvantes em projetos de ótima repercussão, foi fácil esquecer que no início de 2014 o Sunn O))) largou mais uma leva de gravações onde eles se reencontram com o que fazem de melhor: muros de guitarras que remetem ao clássico The Grimmrobe Demos. Não adianta, ninguém faz isso melhor do que eles.
Whirr / Nothing / Whirr / Nothing (Run For Cover): Split que marca a amizade entre as duas bandas (que tem um integrante em comum) através de registros que sucedem os seus prestigiados LPs de 2014. O Nothing apresenta duas faixas que percorrem punk e grunge, pouco relacionadas com o shoegazing de Guilty Of Everything e quem gosta da banda não tem muito do que reclamar. Já o Whirr gravou duas pérolas que, produzidas por Will Yip, os aproximou do emo, afastando-os da barulheira enlamaçada que os caracteriza. Porém, as melodias são tão belas e tudo é tão fortuito, que é difícil não colocar as duas faixas em constante rotação. Não tem muito a ver com o lindo Sway, mas é igualmente irresistível.
Wreck And Reference / Want (Flenser): Creio que já citei essa dupla por aqui, trata-se de dois caras que com uma bateria e um (acho) tablet fazem músicas pesadas o suficiente para derrubar preceitos clássicos do metal. Em Want o W&R sai das texturas áridas e pesadas e envereda por uma sonoridade mais limpa, como que por órgãos e pianos acompanhados por batidas ensandecidas. O efeito catártico fica então menos pronunciado, porém, não menos sugerido. É interessante quando bandas conseguem soar maléficas sem lançar mãos de recursos familiares, pelo contrário, através de caminhos nada esperados.
Drcarlsonalbion / Rogier Small / Elephanto Bianco (Toztizok Zoundz): Embora o elogiado álbum do Earth ainda não tenha me pegado de jeito, esse segundo split entre o guitarrista e a baterista foi uma grata surpresa. Duas faixas de pura intensidade e sons cheios, pronunciados e amplos. O que tinha tudo para ser apenas mais um capítulo pouco relevante nessa incursão de Dylan Carlson pelo western e suas variações até que rendeu um bom caldo.
Ai Aso / Lone (Ideologic Organ): O poder desse álbum está em mostrar como a música tem a capacidade de comunicar por meios nem sempre literais. Registrado em uma apresentação ao vivo da cantora no Japão, Ai Aso canta exclusivamente em japonês, o que dentro do contexto fez todo o sentido. Mas para os ouvintes de fora do pais, resta imaginar que tipo de dor, que tipo de desilusão, ou o quão só a protagonista deve se sentir. Pois a triste e frágil performance vocal acompanhada por mínimos instrumentos não nos dá outra via de interpretação que não seja a franca comiseração e encantamento com aquela inocência inteligível. Destaque também para a linda capa que complementa a temática do LP.
Geryon / Geryon (Gilead Media): Black metal tocado apenas com bateria e baixo. Combinação que limita as chances de se cair nos quase inevitáveis lugares-comum do gênero mas, talvez pela imposição da limitação de recursos, o Geryon acaba superando entraves e convencendo pela ambiência geral que alcança.
Interpol / El Pintor (Matador): Talvez em circunstâncias semelhantes às citadas sobre Monuments To An Elegy, o Interpol tornou-se mais uma banda da qual muito se espera e que, a cada novo álbum, tenta encontrar alternativas para soar tão necessária quanto em seus grandes momentos que já passaram. El Pintor foi um tanto subestimado pois pouco se falou a respeito, terminando o ano como apenas mais uma tentativa do Interpol de não desaparecer do alcance dos ouvintes. Mas o trio gravou seu melhor registro desde Antics, quase que revisitando todos os bons momentos da carreira, um verdadeiro apanhado de boas possibilidades e acertos na medida. Talvez não se consiga mais o clima ao mesmo tempo sorumbático e refinado dos dois primeiros discos mas mesmo assim, El Pintor resgata o interesse pela banda e chega por momentos bem perto disso.
Comentários:
Não há nenhum comentário.
(Não é mais possível adicionar comentários neste post.)