Dying Days
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Discos do mês - Agosto de 2023

Fabricio C. Boppré |
Discos do mês - Agosto de 2023

Crédito(s): foto por Fabricio C. Boppré, no sul da Ilha de Santa Catarina, em abril de 2018.

Metallica - Metallica

Foi lá pelo meio de agosto que a introdução de Enter Sandman começou a repercutir insistentemente em meu cérebro, e depois vieram os riffs de algumas das outras faixas daquele mesmo disco, a melodia de The Unforgiven… Fui sendo, pouco a pouco, acossado pelo “Black Album", e passei a escutá-lo quase que diariamente, um frenesi que durou cerca de duas semanas e culminou em algumas sessões de auto-análise para ver se enfim eu decifrava e resolvia minha antiga cisma com o Metallica. Acho que vou escrever sobre isso depois; sobre o “Black Album” (que oficialmente se chama apenas Metallica), este disco mais se parece uma arena onde todas as suas faixas travam luta sanguinária pelo título de a melhor, sendo que, ao menos de acordo com meu juízo, vence com tranquilidade Nothing Else Matters, que é um destes momentos tão bonitos de ser ver, uma banda sendo alvejada por um resplendor perfeito de inspiração, uma destas canções que de tão irretocável mais parece estar pronta e acabada desde o Big Bang, planejada de lambuja pelas próprias leis que arquitetaram todo o resto, tão essencial ela se parece, tão simples e sublime. E o fato dos fãs mais antigos da banda a detestarem corrobora plenamente minha tese de que os fãs antigos do Metallica estão entre os seres humanos mais estúpidos a caminhar sobre a Terra.

Yes - Big Generator

Eis aqui um disco bastante bom, mas acima de tudo, conveniente. Conveniente porque ao escutá-lo satisfaço de uma só vez duas das minhas extravagâncias: Yes e Arena rock. Não fosse Big Generator e nas últimas semanas ao invés de ter perdido apenas umas cinco horas de minha vida eu teria perdido umas dez. Foi uma crise de identidade, isso pelo que passou o Yes nos anos 80? Eram tão bons nisso — e olha que nem escutei ainda o disco que tem Owner of a Lonely Heart — que fico verdadeiramente em dúvida.

Barthold Kuijken, Marc Hantaï - Wilhelm Friedemann Bach: Six Duets For Two Flutes

Não faz muito tempo e toda vez que eu pensava sobre qual seria meu instrumento musical favorito eu terminava sempre encalhado numa danada duma dúvida que parecia que não se resolveria nunca, ora cogitando o violão, ora o piano, ora a flauta. Não que eu perdesse tanto tempo assim de minha vida pensando nisto, mas com vistas ao plano de um dia, quem sabe, se dispôr de algum tempo livre e disposição, estudar teoria musical e aprender a tocar um instrumento, com vistas a este antigo desejo é que por vezes me ocorria que poderia ser boa ideia adiantar-me e decidir logo qual é meu instrumento favorito, para quando enfim a oportunidade se apresentasse eu não titubeasse e me inscrevesse logo em um curso de aprendizado do tal instrumento. Pensava nisso, ocasionalmente, e não me decidia… Até que certo dia, cinco anos atrás, estava sentado na areia da praia no fim da tarde, sem me ocupar de outra coisa que não observar e escutar (e pensar que já pude empregar meu tempo assim), quando vejo caminhando uma menina no traje inconfundível da mochileira meio hippie tão comum aqui onde moro durante o verão, estrangeira talvez, caminhando descalça pela praia, aparentemente sem rumo, despreocupada. Passa reto por mim e segue seu caminho, mas alguns poucos metros adiante ela pára, larga umas bolsas surradas na areia e senta um pouco mais perto da linha d’água do que eu, ou seja, de costas para mim, em uma posição ainda ao alcance do meu raio de visão, ainda que meio periférica. E não pude deixar de notar quando, passados alguns instantes, ela abre uma das bolsas e de dentro tira uma flauta e começa a tocá-la distraidamente, os olhos fixos no mar, iniciando e parando e reiniciando repetidamente uma melodia qualquer, talvez inventada ali na hora, não sei. A história seria ótima se fosse a garota uma exímia instrumentista que tivesse decidido presentear a pequena audiência — eu e algumas gaivotas — com um breve recital, uma apresentação surpresa justo no meu lugar favorito do mundo, mas nem foi nada disso, e ela nem permaneceu ali mais do que cinco ou dez minutos. O que ocorreu, em todo o caso, foi um momento eureka, finalmente a resolução para a minha velha dúvida sobre qual seria meu instrumento favorito, aquele que aprenderei a tocar acaso algum dia possa me dedicar a isso: oras, um piano não tem como levar na mochila e tocar na praia; um violão até pode-se carregá-lo para lá e para cá sem muito esforço, mas não na mochila, não assim casualmente; a flauta, esta sim presta-se facilmente a isso. A flauta pode ser companheira de viagens e caminhadas e produzir música virtualmente em qualquer lugar, e não imagino critério melhor do que este para definir o tão prorrogado desempate. Além de tudo, percebo ainda uma espécie de afinidade entre eu e ela: não gostamos de ocupar muito espaço, de pesar muito sobre esta terra quente e cansada… Enfim, estava decidido. Um dia, quem sabe. Enquanto isso venho escutando cada vez mais música feita para flauta. Existem até concertos para flautistas solos, porém peças mais simples como sonatas, duetos etc. costumam me atrair mais justamente pela sintonia com o espírito frugal do instrumento, e este disco com seis das obras de Wilhelm Friedemann Bach (primogênito do homem) para a flauta, tocadas pela dupla Barthold Kuijken e Marc Hantaï, é meu favorito dentre todos os que tenho aqui comigo. Marc Hantaï é provavelmente meu flautista predileto; a jovem da foto acima, em todo o caso, seja lá onde ela estiver hoje, tem minha enorme gratidão.

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