Dying Days
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Discos do mês - Dezembro de 2024

Fabricio C. Boppré |
Discos do mês - Dezembro de 2024

Crédito(s): o quarteto de Jeff Parker em foto de autor desconhecido, copiada daqui.

Stephan Micus - To the Rising Moon

Esse disco é bonito que dói. Tudo nele soa antigo e ancestral. É música da gente de outro tempo, da gente miúda esgotada pela labuta excessiva e pela vida difícil, sim, mas que pelo menos ainda contava com o conforto da noite, da fogueira, da interioridade. É fácil imaginá-los assim, juntos e ao mesmo tempo imersos em seus cansaços, vozes e violões expressando suas provações diárias, suas esperanças vestigiais, seus sonhos de cor sépia. Gente com a pele vincada e marcada pelos elementos, porém ainda donos de si, cultivadores de sua subjetividade, de sua arte e sua cultura, gente anterior ao sequestro promovido pelas redes sociais e ao saque totalizante do capital. Gente que talvez continue existindo em pequenas comunidades espalhadas em montanhas perdidas pelo mundo afora?

Church - Heyday

Se eu fizesse resoluções de ano novo, entre elas estaria escutar mais frequentemente ao discos do Church (e de muitas outras bandas, mas prioritariamente do Church). Adoro estes australianos há muito tempo, porém são raras as ocasiões em que a música deles preenche nossos aposentos. Por que será? Talvez não tenham uma marca distinta que faz com que eu me lembre imediatamente deles quando começo a pensar na música que quero escutar, aqui e ali ao longo dos meus dias? O Church é vagamente psicodélico; vagamente post-punk; vagamente similar ao U2... É vagamente muitas coisas, e acentuadamente quase nada. Sequer plenamente australianos eles parecem ser. Porém nada disso é prejuízo à banda: seus discos são plenamente excepcionais, todas essas vaguezas contribuindo para um som que flutua gentil, em um ritmo próprio que parece atravessar todas as faixas, um entorpecimento. Perfeito para estes verões em que não sou mais jovem mas tampouco me sinto velho.

Jeff Parker ETA IVtet - The Way Out of Easy

Os (também australianos) Necks lançaram um lindo disco este ano, Bleed, que esteve por muito tempo em minha lista de favoritos de 2024. Nestes últimos momentos do ano, contudo, ando me debatendo com a difícil decisão de qual disco retirar desta lista para poder alojar The Way Out of Easy, que não pode de maneira alguma ficar de fora, e acho que infelizmente terá de ser o do Necks. Que crueldade (divertida) fazer esta lista: já são muitos os ótimos álbuns que removi para colocar outros melhores... E ainda terei que decidir como fazer com o último disco do Shabakka, que também não está me parecendo nada justo que fique de fora. Mas The Way Out of Easy vai ficar na lista final, seguramente. É um disco bonito demais, venho escutando-o seguidamente nestes últimos dias do ano, quando enfim me permito algum descanso, algum alheamento ao mundo. Meus verões costumam pedir Led Zeppelin e Midnight Oil, mas tenho a impressão de que é sempre nesta época (festiva para a maioria; mais de recolhimento para mim) que costumo descobrir o que de melhor foi lançado em termos de jazz ao longo do ano que termina, como se inconscientemente eu deixasse essa tarefa sempre para o fim pois são estes os álbuns que fornecem as melhores restaurações do espírito. Lembro muito bem de que assim foi com A Cosmic Rhythm with Each Stroke no longíquo ano de 2016 e depois, mais recentemente, com Afrikan Culture (2022). Nos derradeiros dias de 2024 é The Way Out of Easy quem mais me tem feito boa companhia e me ajudado no reencontro com certo antigo eu, um que costumava ter preferência pela lentidão e pela errância. A música é tão assim, tão voltada para dentro e tão acolhedora em seu vagar demorado que ninguém pode senão concordar que não há absolutamente nada de errado nisso, em ser meio lento e meio vagamundo. Sabe-se lá o que vem a seguir, o que nos espera em 2025, mas aqui de onde estou, nestes últimos dias de 2024, a companhia de Shabaka, Jeff Parker e Church têm sido um conforto e um deleite e parece pressagiar enfim um ano menos cansativo e frustrante.

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