Dying Days
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Discos do mês - Outubro de 2022

Fabricio C. Boppré |
Discos do mês - Outubro de 2022

Crédito(s): Vincent Price em imagem copiada daqui.

Pearl Jam - Vitalogy

Em todas as revisões da discografia do Pearl Jam que vejo por aí, o Vitalogy aparece sempre bem na foto, creio até que angariando mais simpatia do que a recebida na época de seu lançamento. Ou talvez ele esteja envelhecendo mais graciosamente do que os outros? Ou talvez seja apenas nostalgia? No que me diz respeito, durante bastante tempo ele foi meu favorito: imediatamente após a primeira audição (em um sábado de manhã, sentado no chão do quarto, colocando o CD recém-comprado para tocar no pequeno micro-system que eu e meu irmão tínhamos) até o momento em que a discografia da banda ficou grande o suficiente e comecei eu mesmo a fazer esse tipo de revisão e reavaliação. Foi quando percebi que, enquanto os dois primeiros são inegavelmente os álbuns mais potentes e perenes do Pearl Jam, aquele pelo qual eu nutro um carinho mais profundo e pessoal é o No Code, por uma série de motivos que qualquer hora eu descrevo por aqui. Creio que a heterogeneidade do Vitalogy é o que faz com que, nos últimos tempos, eu raramente o tire da estante: Nothingman e Whipping, por exemplo, são faixas muito díspares, e elas vêm juntas no tracklist; Bugs é algo que Eddie Vedder deveria ter tentado resolver em algumas sessões de psicanálise, e não no estúdio em que o álbum estava sendo gravado; Better man é uma canção muito bonita, mas o que ela está fazendo em um disco que tem Not for you? Ou uma ou outra estão completamente fora de lugar e de propósito. E enquanto Ten fecha com Release e Vs. com Indifference, Vitalogy fecha com algo cujo título ninguém nunca se deu ao trabalho de aprender como se escreve ou pronuncia. Por outro lado, talvez seja deste disco o maior número de faixas que eu tiraria para um hipotético Best Of pessoal da banda (Last Exit, Tremor Christ, Corduroy e Immortality) e isto me parece motivo suficiente para tê-lo ainda em boa conta.

Electric Wizard - Time to Die

Tem bandas que eu adoro mas ouço muito pouco. O motivo para esta incongruência varia de banda para banda, e no caso do Electric Wizard a explicação está no fato de que cresceu em mim, ano após ano, a sensação de que não faz muito sentido escutá-los se não for nas proximidades do Halloween. Isto é uma tolice, mas eu sou um tolo irrecuperável que não vive sem observar alguns ritos, ciclos e estações. A vantagem, no caso do Wizard, é que chega outubro e eu me esbaldo em seus discos, e este acaba sendo o mês mais legal do ano, descontando o mês de férias (quando há). Como não amar esta banda? É o metal ocultista por excelência, praticamente um filme de horror inglês dos anos 70 subtraído das imagens, e nem é o caso de restar apenas o som, porque a trilha sonora destes filmes não costuma ser doom metal, mas o que resta e irmana a ambos é, principalmente, uma questão de atmosfera, de linda e sombria atmosfera, além, é claro, da licença provisória para uma boa sessãozinha de divertimento sádico e degenerado. O que sempre foi, é minha opinião, o objetivo maior da arte: sadismo e degeneração; tortura e obscenidade; religião e assassinato.

Heat (Music From The Motion Picture)

Michael Mann é um diretor bastante peculiar. Conquanto não seja exatamente um dos maiores mestres da sétima arte, seus filmes possuem uma marca autoral que gosto muito: uma fixação pelo azul que não raro os deixa visualmente deslumbrantes; o uso frequente de planos amplos; vidros e espelhos e iluminação distorcida; as cenas noturnas com personagens à beira do esgotamento, confusos e cansados — estes são alguns dos elementos mais recorrentes e distintivos em seus filmes. Além disso, Mann possui um tato refinadíssimo para escolher a música de suas tramas. Heat é um velho favorito, um neo-noir épico que nunca passo dois ou três anos sem rever. Por um lado, é o filme norte-americano por excelência — mais genericamente falando, “filme policial” —, mas, por outro, a singularidade de Mann como diretor o distingue amplamente de quase todos os outros desta categoria: as tomadas noturnas da cidade, as câmeras fora de foco, a ambiguidade dos personagens, e, claro, a música. A trilha sonora de Heat é uma proeza: estão nas cenas do filme e no tracklist do álbum gente díspar como Moby, Terje Rypdal, Einstürzende Neubauten, Lisa Gerrard (a cantora do Dead Can Dance) e o quarteto de música clássica experimental Kronos Quartet, e o resultado é de uma coesão surpreendente, uma fluidez etérea e algo hierática que transfere à atmosfera urbana do filme um tom meio bíblico, ruas e prédios como que banhados em uma nova espécie de sacralidade, um sagrado mais antropoceno e moderno, maculado o tempo todo pelo sangue que respinga com frequência e pela tensão frenética dos momentos de ação. O filme sem essa música toda já seria ótimo; com ela então torna-se um clássico contemporâneo.

Vincent Price - Witchcraft & Magic: An Adventure In Demonology

Eu provavelmente não saberia responder qual é a minha banda favorita, ou, se estivermos falando do antigo mundo dos pianos, violinos e violoncelos, não saberia responder quem é o meu compositor ou compositora favorito(a), embora neste último caso, devido ao universo menor de possibilidades conhecidas e a uma curiosa coincidência, eu poderia ao menos dizer com alguma segurança que as chances deste possuir um sobrenome que comece com “B" são bastante grandes. Agora, se você me perguntar quem é o meu ator favorito, essa é fácil. É provável até que antes mesmo de você terminar de pronunciar sua pergunta eu já lhe tenha respondido: “quem é o seu ator…” — “Vincent Price”. Price é o patrono do mundo de fantasia cinematográfica que tanto estimamos aqui em casa, mundo feito em boa parte de filmes de terror baratos dos anos 60 e 70, muitos deles baseados em obras de Edgar Allan Poe (ou pelo menos na premissa básica original de algum conto de Poe), muitos dirigidos por Roger Corman. Nas semanas que antecedem o Halloween, além de ouvir doses generosas de Electric Wizard e de King Diamond, nós também assistimos a dezenas de filmes de terror, revisitando ao longo da maratona alguns dos nossos favoritos, o que significa que no fim das contas outubro acaba sendo também um mês repleto de Vincent Price. E outubro de 2022 foi ainda mais pois descobrimos este disco que Price lançou em 1969, quando vivia o auge de sua deliciosa canastrice, ops, quero dizer, de sua potência dramática. Não é exatamente um disco de música: trata-se do ator declamando, sobre alguns poucos efeitos sonoros, um longo texto sobre feitiçaria, uma hora e quarenta minutos da voz melíflua e das entonações e gracejos malignos de Price nos contando histórias sobre bruxas e demônios, descrevendo rituais e poções mágicas e rememorando casos históricos em que o sobrenatural influiu nos destinos do mundo (você realmente acha que sabe como se deu o desfecho da Segunda Guerra Mundial?). Bastante didático e extremamente divertido.

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